segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

O Escaravelho do Diabo, clássico da literatura brasileira, vai se transformar em filme


Há algumas passagens que marcam absurdamente o período entre o fim da infância e o começo da adolescência. Como o primeiro beijo, a primeira viagem à Disney, a primeira vez que se pegou um ônibus sem a companhia dos pais ou a primeira leitura de “O escaravelho do diabo”. Escrito pela mineira Lúcia Machado de Almeida (1910-2005), o livro de suspense juvenil foi lançado pela coleção Vaga-Lume, da editora Ática, em 1972, e tem sido tão popular entre os jovens de várias gerações que já chegou à 27ª edição. O que ainda faltava ao romance, contudo, era uma adaptação ao cinema — lacuna que está sendo preenchida neste exato momento, com as filmagens do longa-metragem “O escaravelho do diabo” no interior de São Paulo.
Para a adaptação, atores e equipe estão desde 12 de janeiro e ficarão até 26 de fevereiro entre os municípios de Amparo, Holambra, Campinas e Jaguariúna, tudo para recriar o clima de mistério da trama em que vítimas ruivas recebem um escaravelho antes de serem assassinadas. A direção é de Carlo Milani, com produção da Dezenove Som e Imagens e coprodução da Globo Filmes.
— Eu li o livro quando tinha uns 13 anos, na escola. Eu estudava no Marista São José, e não era um moleque muito ligado em leitura. Mas, com “O escaravelho”, eu li tudo de uma vez — conta Milani, hoje com 42 anos. — Mais tarde, o que me chamou a atenção foi ter chegado em casa e ver minha filha com o livro. Aí resolvi preparar um projeto para a adaptação.
Filho do ator Francisco Milani (1936-2005), Carlo Milani é diretor na TV Globo, onde trabalhou em novelas como “Terra Nostra”, “América” e “Bang bang”. Ele também tem experiência em teatro, com a direção das peças “A comédia dos erros”, de Shakespeare, “Bodas de papel”, de Maria Adelaide Amaral, e “Estranhos casais”, de Chico Anysio, mas “O escaravelho do diabo” é seu primeiro longa-metragem.
Para essa estreia, ele foi pedir ajuda a Sara Silveira, produtora premiada e conhecida no Brasil por dar chance a jovens diretores em seus primeiros filmes e também por trabalhos mais autorais — por exemplo, são produções dela “Trabalhar cansa”, de Marco Dutra e Juliana Rojas, “Durval discos”, de Anna Muylaert, “Bicho de sete cabeças”, de Laís Bodanzsky, e “Falsa loura”, de Carlos Reichenbach.
O primeiro encontro de Sara e Milani foi inusitado: em 2007, numa churrascaria do Rio, ela foi abordada por um “mala”, que disse que um dia eles trabalhariam juntos. Um ano depois, Sara foi convidada para uma reunião na Globo Filmes, para discutir a proposta de um filme.
— Os executivos estavam lá, mas o diretor estava atrasado. Quando ele apareceu, olhei para aquele menino e vi que era o mala de um ano antes. Ele me disse: “Eu não falei que você iria fazer um filme comigo?” — conta Sara. — Achei tudo isso tão curioso que resolvi aceitar. O orçamento de produção e distribuição é de R$ 5,8 milhões, é o filme mais caro que eu já fiz. Então é um desafio novo lidar com um projeto desse tamanho e com a expectativa de público. O que a gente quer provar, unindo as forças da Dezenove com a Globo Filmes, é que é possível fazer um cinema de entretenimento com reflexão no Brasil.
Na adaptação do texto de Lúcia Machado de Almeida, algumas situações foram modificadas para que a trama fosse mais bem compreendida no cinema. Na obra original, o protagonista Alberto, rapaz que tem o irmão assassinado com uma espada atravessada no peito e sai em busca de pistas do criminoso, é um estudante de medicina de 20 e poucos anos. Agora, na nova versão, Alberto será um menino de 11 anos, vivido pelo jovem ator Thiago Rosseti.
O que não muda é a presença de Pimentel, policial que auxilia Alberto na investigação dos assassinatos. Para o papel, Milani convidou Marcos Caruso.
‘Eu acho que essa garotada de hoje é tão bem informada, assiste a tantas coisas, que não dá para fazer um filme bobinho e infantil’
- MARCOS CARUSOator de 'O escaravelho do diabo'
— Meu personagem tem síndrome de Lewy e passa por momentos de esquecimento. A união dele com o garoto funciona de forma quase inconsciente. Enquanto um está na descendente, o outro é um menino que precisa ascender — explica Caruso. — A gente está contando a história de um ponto de vista adulto. É um drama sob a ótica madura, mas que pretende atingir um público jovem. Eu acho que essa garotada de hoje é tão bem informada, assiste a tantas coisas, que não dá para fazer um filme bobinho e infantil.
O elenco é composto, ainda, por Jonas Bloch, Selma Egrei, Lourenço Mutarelli, Augusto Madeira e Thogum Teixeira, entre outros. O roteiro foi escrito por Melanie Dimantas e Ronaldo Santos, a fotografia é de Pedro Farkas e a direção de arte, de Valdy Lopes Jr..
Na última terça-feira, dentro de um casarão de época em Amparo, foi rodada a cena em que Pimentel aborda Alberto com a notícia trágica. “Infelizmente seu irmão não resistiu, eu sinto muito”, disse o delegado para depois se esquecer de que estava tratando com uma criança que acabara de perder um parente e começar a interrogá-lo como se ele fosse suspeito do crime.
SELEÇÃO COM CEM CRIANÇAS
Thiago Rosseti, então, tem uma das cenas mais difíceis rodadas até então no filme, quando precisa chorar e vomitar pela sensação de desconforto de seu personagem em falar sobre a morte do irmão. Assim como o diretor Carlo Milani, o garoto faz sua estreia em longas-metragens com “O escaravelho do diabo”, o que não quer dizer que ele não seja experiente. Antes, ele já havia participado de novelas, como “Carrossel”, e comerciais. Com dez meses de idade, fez seu primeiro trabalho na TV numa propaganda de um supermercado.
Na seleção para o filme, Thiago teve que superar outras cem crianças que fizeram o teste para viver Alberto.
É um pouco complicado ter que transformar a ficção numa coisa real e natural. Eu fico olhando para as coisas e imaginando que elas são verdade — explica o menino, numa das poucas vezes em que tirou os olhos do jogo “Candy Crush” de seu telefone celular. — Para conseguir vomitar, eles me deram uma coisa com um gosto nojento para colocar na boca. Não quero nem lembrar disso.
O lançamento de “O escaravelho do diabo” está previsto para o meio do ano, época de férias, com o objetivo de atrair um público jovem — além dos pais que se recordam afetivamente da leitura do livro. Se o filme der certo, pode ajudar a abrir um caminho pouco explorado pelo cinema brasileiro, o de produções voltadas para adolescentes. Nos últimos anos, são pouco os exemplos do tipo, como “Houve uma vez dois verões” (2002), de Jorge Furtado, “Antes que o mundo acabe” (2009), de Ana Luiza Azevedo, e “As melhores coisas do mundo” (2010), de Laís Bodanzky.
— Essa garotada adora o suspense do cinema americano. Então acho que podemos acertar nesse caminho — diz Carlo Milani. — Se eu tenho uma expectativa com o filme, é deixar os cinco herdeiros da Lúcia Machado de Almeida felizes. O livro foi muito importante para a minha formação.


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